Julius
Evola
Traduzido do italiano por Marcelo D. Prati
Dentre os outros, dois resultados,
não em pouco tempo devem conduzir a doutrina da raça a um plano espiritual: em
primeiro lugar, com um retorno às origens, essa deve trazer de volta à luz os
significados mais profundos das tradições e dos símbolos, que foram
obscurecidos no curso dos milênios, dos quais sobreviveram não mais que
fragmentos esparsos, deteriorados em costumes e festas convencionais. Em
segundo lugar – e não sem relação a isso – a doutrina da raça deve despertar a
sensibilidade para uma concepção vivente de mundo e da natureza, para limitar o
poder daquela racionalista, profana, cientificista e fenomenicista, que seduziu
o homem ocidental por séculos até hoje. E, sobre tal senso vivente e espiritual
das coisas dos fenômenos, os melhores pontos de referência podem ser dados,
sobretudo das concepções “solares” e heroicas, que as mais antigas tradições
arianas possuíam precisamente.
Bem poucos suspeitam que as festas
atuais, que ainda hoje, no século dos arranha-céus, do rádio, dos grandes
movimentos de multidões, se celebram e tanto as cosmópoles quanto as
trincheiras, máquinas de guerra e massas combatentes, dão continuidade a uma
tradição remota, que nos leva a tempos quando, num período próximo da aurora da
humanidade, se iniciou o movimento ascendente da primeira civilização ariana;
uma tradição na qual, contudo, se exprime menos uma crença específica dos
homens, que a grande voz das mesmas coisas.
Desejando aqui dizer algo sobre
isso, antes de qualquer coisa, vamos relembrar um fato que por muitos é
ignorado, quero dizer, que a origem da data do Natal e aquela do início do novo
ano coincidiam, não sendo essa uma data arbitrária, mas conectada com uma
precisa ocorrência cósmica, no solstício
de inverno. O solstício de inverno cai justamente em 25 de dezembro, que é
a data do Natal conhecida desde então, mas que em suas origens, possuía um
significado essencialmente “solar”. Ele aparece ainda na Roma antiga: a data
natalícia na Roma antiga era aquela do ressurgir do Sol, deus invencível – Natalis solis invicti – Assim, como diz
do sol novo – dies solis novi – na
época imperial se iniciava o ano novo, o novo ciclo. Mas tal “natal solar” de
Roma do período imperial, por sua vez, remonta a uma tradição ainda muito mais
remota, de origem nórdico-ariana. Do mais, o Sol, a divindade solar surge já entre os dii indigetes, ou seja, entre as divindades das origens romanas,
recebidas dos ainda mais longínquos ciclos de civilizações. Na realidade, como
diremos, a religião solar do período imperial, em larga medida, possuiu o
significado de uma retomada e quase de um renascimento, infelizmente alterada
por vários fatores de decomposição, de uma antiquíssima herança ariana.
Mesmo a pré-história itálica
pré-romana é rica de traços do culto solar: carros solares, discos, discos
radiados, estrelas radiadas, cruzes de todo tipo, sem excluir as cruzes gamadas
gravadas, por exemplo, em machados arcaicos descobertos em Piemonte e na
Ligúria. Dessa maneira se pode constatar a passagem, na Itália antiquíssima, da
mesma tradição que deixou, desde a idade da pedra, traços semelhantes ao longo
de todo o itinerário das grandes migrações ário-ocidentais e nórdico-arianas.
Símbolos, signos, hierogramas, notações calendárias ou astrais rudimentares,
figurações sobre vasos, armas ou ornamentos, enigmáticas disposições de pedras
rituais ou de cavernas, depois, mais tarde, ritos e mitos sobreviventes em
civilizações tardias, se estudados segundo os novos pontos de vista próprios à
investigação espiritual e racial do mundo das origens, oferecem ainda
testemunho concordante e unívoco não apenas sobre a presença de um culto solar
unitário como centro da civilização dos povos arianos primordiais, mas também
sobre a importância especial que nesse possuía a data “natalícia”, vale dizer,
aquela do solstício de inverno, o 25 de dezembro.
A fim de evitar equívocos, será contudo,
bom recordar a uma certa classe de leitores, os quais, nesta sede já tivemos a
chance de notar, vale dizer, que falando de um culto solar pré-histórico não se
deve em nenhum momento pensar em formas inferiores de uma religião
“naturalística” ou idolátrica. É uma estupidez pensar que a antiga humanidade e
sobretudo a grande raça ariana divinificasse supersticiosamente os fenômenos
naturais – a verdade é o contrário disso, que a antiguidade concebia os
fenômenos naturais essencialmente como símbolos sensíveis de significados
superiores, espirituais – assim, mais ou menos como espontaneamente sustentados
oferecidos aos sentidos pela natureza para que fossem capazes de serem
contemplados tais significados transcendentes. Que as coisas, entre a parte
menos qualificada de um dado povo antigo, às vezes, possam ter ocorrido de
outra maneira, tal fato pode ser relacionado, mas evidentemente prova assim
pouco, sobre o fato não raro do passar em forma de superstição escrupulosa e
detalhada mesmo em alguns cultos cristãos, em certos povos incultos e fanáticos
do sul.
Prevenido assim um notável mal
entendido, o significado simbólico das expressões arcaicas arianas, como “luz
dos homens”, ou “luz dos campos” – landa
ljòme – dadas ao sol, deve tornar-se claro e se pode também compreender que
exatamente o inteiro curso do sol no ano, com as suas fases ascendentes e
descendentes, se apresentassem da mesma maneira nos termos de um grandioso
símbolo cósmico. Em tal evento solar, o solstício de inverno constitui uma
espécie de ponto crítico, vivido segundo uma particular dramaticidade no
período o qual a estirpe ariana originária ainda não tinha deixado as regiões
nas quais sobrevinha o clima ártico e o pesadelo de uma longa noite. Em tais
condições, o ponto de solstício de inverno – o mais baixo da eclíptica –
aparentava como aquele em que a “luz da vida” parecia extinguir-se, tramontar,
submergir na terra desolada e gelada ou nas águas ou entre as profundezas das
selvas, de onde, contudo, subitamente outra vez se ergue a resplandecer com
novo fulgor. Aqui brota uma vida nova, se põe um novo início, se abre um novo
ciclo: A “luz da vida”, se reacende. Brota ou nasce das águas o “herói solar”.
De além da obscuridade e do gelo mortal vem viva uma liberação. A simbólica
árvore do mundo e da vida se anima de nova força. É em relação a todos esses
significados que já nos tempos pré-históricos anteriores de milênios à era
vulgar, que uma quantidade de ritos e de festas sacras se dispuseram a celebrar
a data de 25 de dezembro, como data de nascimento ou renascimento, no mundo
assim como no homem, da força “solar”.
Pouco se sabe que mesmo a
tradicional árvore de natal, ainda um costume em muitos países e em parte
também na Itália, mas na forma de uma atividade infantil ou, no máximo, de boas
famílias burguesas, é um eco residual próprio de tal antiquíssima, estrita
tradição ariana é nórdico-ariana. Uma tal árvore, extraída de uma
“sempre-viva”, semper virens, ou
seja, da planta que não morre no inverno, pinho ou abeto, reproduz a árvore
arcaica da vida ou do mundo, que no solstício de inverno se ilumina de nova
luz, o que é expresso exatamente pelas luzinhas com as quais a adornamos e que
são acendidas em tal data. E os “presentes” dos quais tal árvore se enche –
hoje meramente regalos para crianças – representam efetivamente o simbólico
“dom da vida” pertencente à força solar que nasce ou renasce. Mas o momento em
que o semper virens, a planta que não
morre, se renova e se ilumina no simbolismo primordial, também aquele, como se
diz, o “herói solar” surge das águas do mesmo modo que, segundo um mito
continuado até o Medievo gibelino depois de ter tido parte importante nas
lendas relativas a Alessandro Magno, a árvore cósmica é também uma árvore
“solar” possuidora de uma íntima relação
com a assim chamada “árvore do império” – arbor
solis, arbor imperii.
Tal fato nos leva a considerar um outro aspecto bastante
interessante das tradições verbais, pelo qual desejamos particularmente
referir-nos à antiga romanidade.
O mithraismo, ou culto de Mithra,
como se nota, é a forma tardia assumida pela antiga religião aria-iraniana
(mazdea), em uma formulação particularmente adequada a uma mentalidade
guerreira. Difundido tal culto na romanidade, sob Aureliano a data do “natal
solar” ou solstício de inverno, o 25 de dezembro veio a se identificar com a
celebração do Natalis Invicti, ou
seja, o nascimento de Mithra considerado como um herói “solar”.
Ao redor do mithraismo em Roma,
como se destaca, seria muito superficial, para não dizer grosseiro, falar sic et simpliciter de “importações” ou
“influências orientais”: o oriente daquele tempo era uma coisa bastante
complexa, na qual figuravam elementos muito heterogêneos – mas dentre esses,
indubitavelmente, também partes importantes e incorruptas da herança espiritual
dos povos arianos e indo-europeus. No que diz respeito à relação que foi
estabelecida entre Mithra e o “natal solar” romano, um notável estudioso pode
observar muito corretamente, que isso não é uma alteração, mas em vez disso, é
uma renovação do calendário romano segundo o qual seu antigo aspecto
astronômico e cósmico que possuía nos tempos primordiais de Rômulo e de Numa e
que conferia às festas o significado de grandes símbolos na coincidência das
datas de tais com grandes eras da vida do mundo.
Depois disso, é importante examinar
o atributo de invictus-aniketos –
dado a Mithra – ao herói solar na nova concepção romana. É um atributo
“triunfal”. Nas tradições originárias ario-iranianas e afins, esse é o atributo
de toda natureza celeste e eminentemente do sol, enquanto a luz que vence as
trevas, força luminosa urânica sobre a qual jamais aquelas da noite e da
escuridão prevalecerão. Mas em Roma, vemos que o mesmo epíteto invictus torna-se um título imperial,
cesáreo e nós sabemos que o mithraismo, mais do que o culto de uma divindade
abstrata, torna-se “indutor” – por assim dizer – da mesma qualidade de Mithra
nos iniciados, por meio de uma certa transformação de sua natureza. É então,
evidente a tendência a compreender também de modo simbólico e analógico o
atributo “solar”, de modo a poder fazer valer para o homem e propriamente a
demarcar o tipo e o ideal de uma humanidade superior – para não dizer,
verdadeiramente, uma “super-humanidade”. Como o sol ressurge, perenemente
vitorioso sobre as trevas, de igual maneira, em uma perene vitória interior
sobre a natureza mortal e instintiva se traz à completude um ser, que uma
mística virtude age, regularmente, eminentemente à função de rei, de líder, de
dirigente. É assim que em Mithra, o “herói solar”, foi venerado em Roma um fautor imperii; é assim que se
estabelece uma íntima relação do simbolismo solar com as ideias de realeza e de
império, em sua mais alta forma.
Tal relação seria destaque
particular nas tradições heroicas dos antigos povos arianos, e nós, nesse mesmo
local, já falamos dela, tratando da doutrina mística da “glória”. Não desejando
repetir, portanto, coisas já ditas, nos limitaremos a relembrar da presença
desses mesmos significados na antiga Roma. A victoria Caesaris, ou seja, a mística força triunfal que, no
símbolo de uma estatueta, de um César era transmitido a outro, reflete
exatamente as mais antigas tradições ario-iranianas em volta da realeza e o
assim chamado hvarenô: pois, como já
dissemos no artigo relembrando, o hvarenô
se vale como uma misteriosa força “solar” de invencibilidade e de “glória” que
investe o dirigente, faz desse algo de mais que simples homem e a ele testifica
sua certa vitória.
Uma antiga efígie romana de Sol representa esse deus simbólico com a
mão direita elevada em gesto “pontifical” de proteção e com a esquerda segura
uma esfera, símbolo do domínio universal. Em outra imagem, se vê, contudo, o
mesmo deus que transmite o globo ao imperador, junto das inscrições, as quais
se referem exatamente à “solaridade”, estabilidade e ao imperium de Roma: Sol
conservator orbis, Sol dominus romani imperii. Outro medalhão
particularmente interessante possui no centro a imagem laureada do imperador –
com a cabeça cingida pelo semper virens,
de impecáveis ramos: atrás está o deus solar com a esfera, mas ainda, próximo,
uma cruz gamada (que vemos ainda
presente também na Roma antiga) e os dizeres: soli invicto comiti – ou seja: ao deus solar, companheiro
invencível. Ainda uma imagem – conservada no Museu Capitolino – nos mostra a
associação do símbolo do Sol Sanctissimus
com a Águia, com o animal fatídico de
Roma, que se pensava fosse também aquele, através do qual o espírito transumado
dos imperadores mortos vinha simbolicamente carregado da pira funerária no céu.
Demonstrações análogas podem ser facilmente multiplicadas. Não é arriscado
dizer que esses nos falam de um verdadeiro e próprio “mandato divino solar”
qual alma viva daquela função imperial cesárea, que, para nós, no mundo antigo,
foi uma espécie de último meneio de significados arcaicos, pouco a pouco
perdidos.
Na
antiga semana romana, o “dia do sol” era o “dia do senhor” – e esse significado
sobreviveu nos tempos sucessivos com o termo de domingo (domenica), vindo de dominus,
senhor, assim como na designação germânica sonntag
ou em inglês Sunday para o mesmo dia
de “festa” se conservou literalmente o significado de “dia do sol” e com isso,
o reflexo da antiga concepção solar ariana. Algo da sabedoria dos primórdios
parece assim estar conservado, de alguma maneira, na mesma festa anual do
Natal, mesmo que a celebração do ano novo esteja dela dissociada. O simbolismo
da luz permanece – se recorda, por exemplo, a palavra do prólogo do Evangelho
de João: erat lux vera, quae illuminat
omnem nominem venientem in hunc mùndum – assim como o atributo de “glória”, que surge um pouco mais abaixo.
Em traços monumentais do primeiro período romano o mesmo símbolo da cruz se une
àquele solar.
Na
tradição ariana e nórdico-ariana e na mesma Roma, o mesmo tema foi uma carga
não apenas religiosa e mística, mas sacra, heroica e cósmica ao mesmo tempo.
Foi a tradição de um povo, ao qual a mesma natureza, a mesma grande voz das
coisas, falou naquela data, de um mistério de ressurreição, de nascimento ou
renascimento de um princípio não apenas de “luz” e de nova vida, mas também de
um imperium, no senso mais alto e
augusto do termo.
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