André Otávio Assis Muniz
Jacob Boehme é considerado por
muitos pensadores tradicionais importantes como um profundo esoterista e um dos
maiores Iniciados do Ocidente. Suas ideias influenciaram toda uma época e
continuam, ainda hoje, a influenciar.
De fato, homens como Philip Jacob
Spener, William Law, Hegel, William Blake, Goethe, Leibnitz, Louis Claude de
Saint-Martin, Jean Baptiste Willermoz, Joseph de Maistre, Kelpius etc., foram
influenciados por seu pensamento.
Hoje em dia, com a imensa avalanche
de neo-espiritualismo e de instituições pseudo-iniciáticas, e mesmo
contra-iniciáticas, vale a pena conhecer e estudar as obras de Boehme que,
durante toda sua jornada terrestre, foi um Iniciado independente e sempre
prezou sua liberdade de consciência.
As obras de Boehme não são
leituras fáceis como as apreciadas nos meios “místicos” contemporâneos, seja lá
o que essas pessoas entendam por “místico” (palavra cuja raiz é a mesma de
“mistério”). São textos que demandam atenção e conhecimento prévio das ciências
sagradas tal qual eram praticadas na época.
Jacob Boehme nasceu na Alemanha,
perto da cidade de Görlitz, numa aldeia chamada Alt Seidenberg, na região
conhecida como Lusatia Superior. Corria o ano de 1575 da Era Comum. A família
era proprietária de terras, mas Jacob foi considerado fraco para a dura lida do
campo e, por isso, aos 14 anos, depois de frequentar a escola de Alt
Seidenberg, tornou-se aprendiz de sapateiro. Em 1599 foi admitido na guilda dos
sapateiros como mestre-artífice e tornou-se oficialmente cidadão de Görlitz.
Boehme era um leitor voraz e
profundamente interessado em religião, alquimia, hermetismo etc. Em 1600,
Martim Moller, cidadão destacado de Görlitz, organizou um grupo de estudos na
Paróquia Luterana local que na prática era um tipo de irmandade chamada de
“Conventículo dos Servidores Reais de Deus”, ao qual Jacob Boehme foi convidado
a juntar-se.
Boehme teve uma série de visões
interiores, entre elas uma em que viu os raios de sol sendo refletidos em um
jarro de estanho e sentiu que aquilo representava a Iluminação mística, na qual
a alma limpa refletia a Luz Divina. Tal visão foi um marco em sua busca pelos
mistérios ocultos da natureza.
Boehme colocou algumas de suas
percepções por escrito e esse material acabou vazando do grupo do Conventículo
e lhe causou sérios problemas com as autoridades eclesiásticas luteranas
locais, tendo em vista o forte teor gnóstico da doutrina de Boehme. A
perseguição foi violenta a ponto de Boehme ser preso e interrogado sobre suas
ideias, o que o prejudicou muito em seus negócios locais.
Uma das passagens mais
interessantes da vida de Boehme é, sem dúvida nenhuma, sua misteriosa
Iniciação.
Durante o tempo de sua
aprendizagem, quando seu mestre estava ausente na sapataria onde era aprendiz,
viu entrar um homem estrangeiro, muito bem vestido, apesar da simplicidade e
austeridade das vestes. O homem tinha um aspecto venerável e escolheu um
determinado par de sapatos sobre o qual perguntou o preço. Boehme, julgando-se
inepto para colocar um preço nos produtos na ausência de seu mestre, colocou um
alto valor na certeza de que o homem recusaria e ele não seria repreendido por
seu mestre. O estrangeiro, no entanto, pagou o valor sem sequer tentar
pechinchar, se afastando em seguida. Após dar alguns passos para fora da
sapataria, voltou-se e, com voz alta e firme exclamou: “Jacob! Venha cá!”.
Boehme, a princípio, ficou assombrado com o fato do homem chamá-lo pelo nome de
batismo, no entanto, passado o susto inicial, decidiu atendê-lo. O homem, do
lado de fora, com ar sério e, ao mesmo tempo, muito cortês, disse-lhe: “Jacob,
você é ainda muito pequeno, ou pouca coisa, mas você será grande e se tornará
outro homem, e será objeto da admiração de todos. Isto porque você é piedoso,
crê em Deus e reverencia Sua palavra, acima de tudo. Leia cuidadosamente as
santas Escrituras, nas quais você encontrará consolação e instrução, pois você
sofrerá muito; terá de suportar a pobreza, a miséria e as perseguições; mas
seja corajoso e perseverante, pois Deus o ama e é bom para você.” Em seguida, o
homem fixou-o profundamente nos olhos, apertou-lhe a mão e se foi, sem deixar
qualquer indício. Boehme dizia que a fisionomia daquele homem sempre pairava
diante de seus olhos.
A extrema simplicidade e
informalidade de tal Iniciação revela um contraste imenso com as pompas,
apetrechos, cerimônias etc., das quais hoje em dia tantos pseudo-iniciados
fazem questão. Pompas vazias, sem nenhuma substância real.
Boehme faleceu em 1624 e ainda
depois de morto foi objeto de perseguições. Seu túmulo foi profanado com o
apoio do pároco luterano local.
Dentre suas obras podemos
destacar (já com tradução para o português): “Aurora Nascente” (1612), “Os Três
Princípios” (1619), “A Vida Tríplice do Homem” (1620) e “Quarenta Questões
sobre a Alma” (1620).
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