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domingo, 31 de julho de 2016

Espiritualidade Verdadeira

"Tem sido esquecido com frequência que a espiritualidade exprime um modo de ser: que ela não é função do que a cabeça armazenou como noções, teorias etc., mas do que se conseguiu fazer vibrar ao ritmo do seu próprio sangue, e que se traduz numa superioridade, numa purificação profunda da alma e do corpo." (Julius Evola - Meditação nos Cumes, 1974)

Mistérios Iniciáticos do Taoísmo: Os Cinco Imperadores

Por André Otávio Assis Muniz

A estrutura mitológica do Taoísmo se organiza como o antigo Império Chinês. Os deuses têm funções específicas e cumprem papéis administrativos no Universo.

Para ajudar-lhe a governar a Terra, o Imperador de Jade (玉帝) nomeou deuses titulares para as diversas regiões. O Grande Imperador do Pico do Leste (太岳大帝) é o Deus de Taishan, a Grande Montanha de Shandong. Nos livros do Cânone Taoísta ele aparece em companhia dos "Cinco Santos Imperadores" (五聖帝) que controlam os picos do Sul, do Oeste, do Norte e do Centro (respectivamente, na China, são: Hengshan, Huashan, Hengshan - escrito com outro ideograma, diferente do pico do Sul e Songshan. O Imperador do Pico do Leste é uma autoridade regente da Terra e dos homens, estando sob a autoridade do Soberano de Jade (玉清) e rege o mecanismo da vida. É o que determina os nascimentos e que recolhe os mortos.

Nas sociedades iniciáticas secretas chinesas (as chamadas Tríades ou "Sociedade do Céu e da Terra" - 天地會), o mestre da Loja representa o Soberano do Pico do Leste, e se senta no Oriente. Ele é quem dá a "vida" à Loja e determina a "morte" simbólica de seus membros. Cada um dos Cinco Imperadores representa um "Centro Iniciático", um tipo de "axis" ou coluna em torno do qual se organizam as atividades. Cada oficial das lojas das Tríades está ligado a uma região geográfica ou pico.

É interessante traçar um paralelo com a Maçonaria. O Venerável Mestre se senta no Leste, como o "Soberano Santo Imperador do Pico do Leste". O símbolo de "regência" das Lojas de origem francesa é o Delta (três ângulos, representando Três Princípios), cujo princípio controla ao Venerável Mestre...No Taoísmo, a regência sobre o "Soberano Santo Imperador do Pico do Leste" é a Tríplice Pureza (sobre a qual já falamos). Assim como os "Soberanos e Santos Imperadores" controlam as regiões determinadas por seus picos, os oficiais das Lojas (tanto das Tríades quanto das Maçônicas) controlam suas regiões (Norte, Sul)...O cobridor controla o Ocidente (Pico do Oeste), enquanto o centro da Loja é controlado pelo Mestre de Cerimônias...Essas similaridades deixaram alguns pesquisadores bastante surpreendidos quando tiveram os primeiros contatos com as Tríades Chinesas...

Albert de Pouvourville, ocidental iniciado nas Tríades vietnamitas de origem chinesa, sob o nome de "Matgioi", escreveu um interessante relato sobre essas semelhanças.


Superação da moral

"Depois de ter eliminado as noções correntes de bem e mal, a superação objetiva do plano da moral, sem polêmicas, se realiza com efeito pelo conhecimento das causas e dos efeitos e por uma conduta que só tem esse conhecimento como base. A noção moral de pecado deve substituir-se pela de falta ou, mais exatamente, pela de erro. Para quem situou seu próprio centro na transcendência, a idéia de pecado tem tão pouco sentido como base. A noção moral de pecado tem tão pouco sentido como as noções correntes e, variáveis, de bem e mal, de lícito e ilícito. (...)perdem seu valor absoluto e são postas objetivamente a prova em função das consequências de fato derivadas de uma ação interiormente liberada de tais noções. (...) Podemos fazer referência especialmente a esta concepção bastante conhecida, mas quase sempre mal compreendida, devido aos já citados moralizadores, a chamada lei do karma. Esta lei concerne aos efeitos produzidos em todos os planos por atos determinados, de forma natural e direta, sem nenhum caráter positivo ou negativo, nem de sanção moral, mas simplesmente porque estes atos contém já a causa (de seus resultados)." (Cavalgar o Tigre)

Os oito "guá"

Por André Otávio Assis Muniz

Os oito "guá" (八卦) são apresentados de duas maneiras diferentes. A maioria das pessoas nem nota e nem se importa em saber.
Isso está intimamente ligado à cosmogonia chinesa tradicional.
O "sopro original" (yuanqi - 元氣) ou Yang Puro (chunyang - 純陽),gerou o sopro cósmico (qi - ) através da união do Yin e Yang originais (元陰元陽 yuanyin e yuanyang) também chamados de Yin e Yang reais (真陰真陽 zhenyin e zhenyang).
O sopro cósmico então dividiu-se de forma a estabelecer o Yin e Yang, ou Céu e Terra (esse estágio é chamado de "abertura do Céu" 開天 - kaitian). O Yin e o Yang imediatamente se juntaram novamente, levando ao estágio final da manifestação das dez mil coisas (萬物 wanwu). "Xiantian" (先天) ou "Antes do Céu" ou ainda "Céu Anterior", refere-se ao estágio anterior à junção de Yin e Yang originais para formar o sopro cósmico, ou seja, antes da manifestação das "dez mil coisas", enquanto o "Depois do Céu" ou "Céu Posterior" (後天 Houtian), refere-se ao estado depois que Yin e Yang se juntaram e geraram o sopro cósmico que formou Céu e Terra e levou à manifestação das dez mil coisas.
Antes da manifestação, o Yin e Yang originais estavam em estado potencial em seus opostos. Essa noção aparece na frase "陽中之陰", ou seja, "Yang no meio de Yin".
Nos oito guá (bagua), a primeira representação é a de Xiantian (Céu Anterior). Ela é atribuída a Fuxi, o primeiro Imperador mítico. Nessa representação, o Yin e Yang originais (元陰元陽) juntaram suas essências e geraram os trigramas Li e Kan ("Yin dentro de Yang" e "Yang dentro de Yin") que são colocados no Leste e no Oeste. Os outro quatro Trigramas são colocados nos pontos intermediários. O cosmos é gerado depois que Li e Kan se atraem e juntam suas linhas internas.
A representação dos guá Xiantian é atribuída ao Rei Wen de Zhou (1099 -1050 a.E.C.)

Na representação de Houtian (Céu Posterior), as posições originalmente ocupadas por Qian e Kun () são tomadas por Li e Kan (), para mostrar que a mudança do estado incondicionado para o condicionado ocorreu e que o Yin original é agora encontrado dentro do Yang cósmico ( o trigrama Li - Fogo) e que o Yang Original está dentro do Yin cósmico ( o trigrama Kan - Água).


先天 Xiantian

後天 Houtian

O corpo


"O corpo é parte da "pessoa" como um instrumento definitivo de expressão e ação na situação vivida de fato; Dessa forma é óbvio que o indivíduo deve estender a ele a disciplina e o controle de maneira a assegurar a completude do ser. Isto, no entanto, não tem nada a ver com o culto da personalidade física, muito menos com a mania por esportes, especialmente por esportes coletivos, um dos mais vulgares e difundidos opiáceos para as massas." (Julius Évola - Cavalgar o Tigre)

Avarna e Ativarna no século XXI

Por André Otávio Assis Muniz

Segundo a tradição Indo-Européia, podemos classificar as pessoas de acordo com sua casta, ou seja, sua "varna".
A idéia tradicional de "varna" não é, como muitos acreditam, baseada no nascimento em uma família de tal varna. Essa forma de classificar a casta é mais recente e foi chamada de "jati", ou seja, posição assegurada pelo nascimento.
A idéia de "jati", ou seja, de casta por nascimento, foi combatida por grandes Iluminados e Sábios que diziam ser essa uma inovação contrária ao verdadeiro conceito de casta.
O Buda Shakyamuni nunca foi contra as castas em si, mas sim contra a idéia de casta por nascimento (jati).
De acordo com os conceitos tradicionais, podem-se classificar as castas da seguinte forma:

Brahmana: Sacerdote. Tem vocação para o Sagrado, para a execução dos ritos, para o estudo, para a contemplação, para o ensino metafísico, para a vida mais puramente intelectual, tendo em vista que a intelectualidade pura e a vida espiritual não são coisas diferentes. O Brahmana se dedica às atividades mais elevadas, à transmissão da Tradição, das Escrituras Sagradas, da línguas sagradas etc.
Kshatriya: Guerreiro. Tem vocação para a manutenção da ordem social, para a organização, para os estudos com finalidades práticas que possam implementar a ordem ensinada e transmitida pelos Brahmana. Seu papel é o de garantir a paz e a harmonia e fazer cumprir a justiça para que os Brahmana possam transmitir a Tradição, instruir, fazer a ponte da sociedade humana com o sagrado etc. O chefe dos Kshatriya é o rei. Sua missão só é legitimada através da sagração dos Brahmana e deve seguir, escrupulosamente, os ensinamentos transmitidos por eles. A legitimação do Kshatriya está ligada, diretamente, ao seu papel de defesa dos ensinamentos do Alto.
Vaishya: Burgueses. São a base econômica da sociedade. Sua vocação está ligada ao comércio, à produção de bens, de alimentos, de tudo aquilo que se encontra ligado ao bem estar material da sociedade. São os responsáveis pela produção de riqueza e pelo equilíbrio econômico da sociedade.
Cada uma dessas funções é determinada por uma legítima vocação, pela tendência clara e indubitável que um indivíduo tem para com uma determinada atividade.
Abaixo das castas se encontram os "avarna", ou seja, os "sem casta", aqueles cuja vocação é para o nada, para uma vida desprovida de função, para a inação, para a vagabundagem pura e simples. O "sem casta" desempenha funções por simples necessidade de sobrevivência e não se importa com o fato dessas atividades serem desonestas, anti-éticas ou contrárias ao que é ensinado pela ordem tradicional.
No mundo moderno, um mundo profundamente doentio, as castas são desprezadas e os indivíduos são lançados às atividades sem que, necessariamente, tenham qualquer identificação ou vocação para com elas. Assim, em vez de castas, temos "classes" onde pessoas completamente diferentes são colocadas de acordo com a quantidade de dinheiro que possam juntar, independentemente da sublimidade ou importância real da função que desempenhem.
Em uma inversão total de valores, as "altas classes" são, de maneira geral, compostas por "avarna", ou seja, pessoas sem uma vocação específica que, de alguma maneira, jogando-se aqui e ali em busca de dinheiro, conseguiram sucesso econômico.
Os Brahmana, nesse contexto, são tomados por "sonhadores", "inúteis", "teóricos", "beatos" etc.
Os verdadeiros Kshatriya são colocados à margem das instituições das quais deveriam estar à frente por não entrarem "no esquema" imposto pelos avarna.
Os Vaishiyas frequentemente têm que lidar com concorrência desleal, métodos industriais pouco honestos, manipulação, formação de monopólios que os esmagam etc.
É, definitivamente, o reino dos avarna.
Acima de todas as castas e renunciando à sua função social, estão os "ativarna", os que estão acima das castas. Esses, percebendo a transitoriedade de tudo, renunciam às leis sociais e seguem a busca pelo Absoluto, sem se voltarem para os que desejam viver de acordo com a sociedade. Frequentemente, os "ativarna" saem da casta dos Brahmana e dos Kshatriya.
No mundo moderno, os ativarna seguem anônimos, em acordo com sua própria "Lei Interior".

Exoterismo e Esoterismo


"A adesão a um exoterismo é uma condição prévia para chegar ao esoterismo e, além disso, não deveria se acreditar que este exoterismo possa ser dispensado quando a Iniciação seja conseguida, do mesmo modo que os alicerces não podem ser suprimidos quando o edifício tenha sido construído. Acrescentaremos que, na realidade, o exoterismo, longe de ser dispensado, deve ser "transformado" na medida correspondente ao grau alcançado pelo iniciado, posto que este se faça cada vez mais apto para compreender suas razões profundas e, consequentemente, suas fórmulas doutrinais e seus ritos adquirem para ele um significado realmente muito mais importante que o que possam ter para o simples exoterista, que, em suma, estará sempre reduzido, por definição, a não ver senão a aparência exterior, quer dizer, o que menos conta com relação à "verdade" da tradição considerada em sua integralidade." (René Guénon -Iniciação e Realização Espiritual) 

Sociedades Iniciáticas na China

Por André Otávio Assis Muniz

As Tríades (天地會- Sociedade do Céu e da Terra) foram responsáveis pela organização de diversos movimentos de resistência na China. Utilizando propaganda, doutrinação e violência cirurgicamente aplicada, eram temidas e respeitadas.
No Ocidente, começaram a ser estudadas com mais atenção depois dos livros de Albert de Pouvorville (Matgioi), que foi o primeiro ocidental conhecido a ser iniciado em uma Tríade chinesa no Vietnã.
Matgioi foi o responsável pela Iniciação Taoísta de René Guénon, assim como pela primeira transmissão dos ensinamentos desses grupamentos ao Ocidente. 
Traduziu clássicos chineses para o francês e escreveu vasto material sobre o funcionamento das Lojas.
Basicamente, a estrutura dos membros era a seguinte:

红棍 Hóng gùn, "O bastão vermelho", responsável pela organização e execução de todo tipo de ação violenta externa. Deveria ser  especialista em artes marciais e participar dos "times de assalto" que só deveria contar com outros especialistas em artes marciais. Seu prestígio era grande. 

白紙扇 Báizhǐ shàn, " O leque branco". Era o conselheiro, o administrador, o que realizava os estudos. Seu atributo, um leque de papel branco montado sobre uma armação de bambu, com 13 pregas, representando as 13 províncias do Império dos Ming. O "Mestre do Incenso" da Loja era, geralmente escolhido dos membros desse rank.

草鞋 Cǎoxié, " O sandália de palha" era o mensageiro, aquele que tratava do serviço de informações e de passar as tarefas para todas as divisões da Tríade. Seu papel era determinante pois, se errasse, comprometeria as ações pensadas pelos "leques brancos" e que deveriam ser postas em prática pelos "bastão vermelho". 

四九 Sìjiǔ, literalmente "O quarenta e nove", mas é um jogo com os ideogramas. Significa, na realidade "4x9" ou seja, 36, que era o número de  votos que o membro deveria fazer para pertencer ao grupo.

Acima desses estavam: 

山主, Shān zhǔ,  "Mestre das Montanhas" . Não era o chefe absoluto, que tomava todas as decisões.  Coordena todas as decisões tomadas localizadamente. Em caso de conflito de interesses, é ele que dava o voto de desempate. 
Abaixo desse mestre estava o , 香主, Xiāng zhǔ, "Mestre do Incenso" o equivalente a um sacerdote responsável pelos diferentes ritos.

O 先鋒, Xiānfēng ou "pioneiro", é o assistente do Mestre do Incenso, que é também o oficial responsável pelo recrutamento para os neófitos na sociedade .
O chefe de cada uma das seções que citamos acima era chamado de 主持, Zhǔchí "Presidente". 
O título de Dà lǎo 大佬, "Grande Irmão" era um termo respeitoso empregado para membros mais antigos, que haviam prestado serviços relevantes para a organização.
Essa era a organização da Loja.
Acima das Lojas estava o Grão-Mestre, chamado de 龍頭, Lóngtóu, "Cabeça de Dragão", que muito poucos membros conheciam.













Ação desprovida de desejo

"Agir sem aguardar resultados, sem ser afetado pelas chances de sucesso ou fracasso, vitória ou derrota, ganho ou perda, muito menos por prazer ou dor, ou pela aprovação ou desaprovação dos outros. Esta forma de ação foi também chamada de "ação desprovida de desejo." A mais alta dimensão, que se presume estar presente em si mesmo, manifesta-se pela capacidade de agir não com menos, mas com mais dedicação que o tipo humano comum pode dar às formas ordinárias de ação condicionada. Pode-se falar aqui em "fazer o que precisa ser feito," de maneira impessoal." (Julius Évola - Cavalgar o Tigre- Capítulo 11 - Agindo Sem Desejo - A Lei Causal)

O Grau 17 do Rito Escocês Antigo e Aceito - “Cavaleiro do Oriente e do Ocidente”

Por André Otávio Assis Muniz

I. História do Grau 17

Algumas versões mais antigas desse Grau, que aparecem por volta de 1760, trazem o nome de “Cavaleiro do Ocidente”, como por exemplo, o Ritual do Marquês de Gage, datado de 1763.  A primeira versão com o título “Cavaleiro do Oriente e do Ocidente” é de 1762 e se encontra na Biblioteca Nacional da França. Apesar da diferença do título do Grau, o ritual é essencialmente o mesmo.
O Grau 17 aparece no Manuscrito Francken (uma fonte primária do Rito de Heredom) como um ritual autônomo com um fundo cavalheiresco, retirando algumas passagens do livro bíblico do Apocalipse. Rituais mais antigos falam desse Grau como sendo um Grau de Cavalaria, historicamente não relacionado com a Maçonaria.
O Grau, apesar de numericamente anterior ao Grau de Rosa-Cruz, é cronologicamente, posterior.
O 1º Ritual do Grau 17, propriamente do R.˙. E.˙. A.˙. A.˙. (fundado em 1801 nos E.U.A.), foi aprovado pelo Supremo Conselho da Jurisdição Sul em 1870 e já comportava algumas modificações importantes em relação ao seu ascendente do Rito de Heredom. Nessa versão (1870) o Grau 17 aparece como um prelúdio para o Grau 18, onde se buscava a palavra perdida do Mestre.
No ano de 1939 uma alegoria dramática, repleta de pompa e que necessitava de um largo elenco para sua execução, foi proposto como substituto para o Ritual do Grau 28 e aprovado como tentativa do que se tornaria o ritual do Grau 28 de 1940. O autor desse ritual foi o Irmão Harry K. Eversull, 32º, um clérigo e presidente do Colégio Marietta em Ohio. A configuração da alegoria era o Templo de Jerusalém construído pelo Rei Herodes, que teria suplantado o segundo Templo, construído por Zorobabel no primeiro século da Era Comum.
A idéia foi bem acolhida pelo Soberano Grande Comandante Melvin Johnson, entre outros, mas acharam que a alegoria caberia melhor como sendo do Grau 17, pois poderia ser o “Grau de Transição” entre o Antigo e o Novo Testamento, ou seja, o prelúdio para o Grau 18, tendo em vista que o Templo de Herodes foi o que foi visitado por Jesus que o comparou com seu próprio corpo (Jo. 2,19-22), orou nele e, inclusive, previu sua destruição, assim como de toda Jerusalém (Lc. 19, 44). Essa mudança foi efetuada em 1942, quando o ritual do Grau 17, utilizado desde de 1870, foi substituído por aquele que foi a tentativa do Ritual do Grau 28.
O ritual novo não foi universalmente aceito. Um estudo realizado em 1954 revelou que muitos Capítulos nem o tinham adotado e nem tinham a intenção de fazê-lo, tendo em vista as dificuldades apresentadas pelo novo ritual, como cenário ritualístico e o grande número de Irmãos requeridos para sua execução. Sendo assim, em 1957, o Supremo Conselho suspendeu a utilização do ritual aprovado em 1942 e restaurou a utilização da versão de 1870.
Nos EUA, outras reformas se fizeram necessárias e outras modificações foram e voltaram. Os rituais do Grau 17 foram revistos em 1989, 1994, 2002 e 2007 (até onde temos notícia).
No Brasil, em linhas gerais, o Ritual se manteve fiel ao teor cavalheiresco, apesar de em seu simbolismo e alegorias, ter sido notavelmente empobrecida a passagem da idéia de uma Cavalaria Terrestre para a Cavalaria Celeste entre outros elementos.

II. A Mitologia do Grau

A mitologia do Grau remete-nos ao ano de 1118, quando os Cruzados do Ocidente teriam se unido aos Maçons do Oriente sob a condução de Garimont (outra interpretação da letra G da Estrela Flamejante), Patriarca de Jerusalém. O objetivo do Grau seria de velar pela segurança dos peregrinos.
O ano de 1118 não foi escolhido ao acaso. Neste ano foi fundada a Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Jerusalém por Hugues de Payns, ou seja, a Ordem dos Templários.
 Um dos rituais franceses utilizados atualmente traz o seguinte texto:
“Quando os Cavaleiros do Oriente e os Príncipes de Jerusalém reuniram-se para conquistar a Terra Santa, levavam uma cruz para distinguirem-se, como uma marca dos que iriam combater sob a mesma bandeira. Ao mesmo tempo,  fizeram um juramento de que derramariam até a última gota de sangue para restabelecer a verdadeira religião.
A paz tendo sido alcançada, eles não puderam realizar seu desejo (pelo martírio) e retornaram a seus países. Sendo assim, resolveram unir a teoria e a prática e, juntando-se à Ordem de Malta, que naquele momento era relativamente ligada à Maçonaria, não admitiam em suas cerimônias senão quem tivesse dado provas de sua amizade, zelo e discrição.
Eles adotaram o nome de Cavaleiros do Oriente porque o sentimento que os guiava era tão grandioso, que embelezava àqueles que o possuíam e juntaram a este o “e do Ocidente” para fazer conhecer à posteridade as partes do mundo onde esta Ordem tinha surgido. Eles não mudaram nada de sua recepção que permaneceu a mesma que a de hoje. 
Foi em 1118 que os onze primeiros Mestres Maçons fizeram seus votos entre as mãos de Garinum, Patriarca e Príncipe de Jerusalém, mas eles contavam mais de cinco séculos desde a origem de seu estabelecimento no Ocidente.”

III. Tema do Grau

Este Grau ensina a necessidade de partir em luta contra os danos causados pela intolerância, os juízos temerários, o fanatismo, destruidores da humanidade assim como contra a ignorância que engendra os erros e o obscurantismo. Em resumo, fala da luta contra tudo que é obstáculo para o surgimento de uma consciência clara e luminosa.
 O ritual brasileiro dá enfoque especial ao direito de reunião e à conscientização do povo em relação ao seus direitos através da educação.
A “túnica manchada de sangue” é um resquício do voto dos Cavaleiros que, infelizmente, desapareceu do ritual brasileiro atual.

IV. Símbolos e Alegorias do Grau

O Peregrino: Vestidos como peregrinos, os Príncipes de Jerusalém ingressam na Câmara. O peregrino simboliza o estado do homem sobre a Terra, o qual cumpre seu tempo de provações rumo a um estado superior. O termo designa alguém que se sente estrangeiro no meio em que vive. Sendo o mundo profano cercado pelas trevas da ignorância, da superstição, do fanatismo, o maçom virtuoso é sempre um “estrangeiro” em meio à escuridão que o cerca. Os príncipes, que poderiam estar vestidos com o luxo e a distinção de sua condição de nobres, são revestidos com as pobres vestes do peregrino. O término da viagem, um objetivo superior, é sua recompensa.

Os Essênios e o lago Méris: O nome "essênio" (do grego: essaioi) parece se originar a partir da denominação Issi'im, utilizada por terceiros para denominar o grupo. O termo é derivado aparentemente a partir da Síria (essaya ou essenoí) e este do aramaico (chasajja = "piedoso"). Os essênios serão chamados também de Jachad, o que significa "união", "comunidade" e, finalmente, por esseni em latim, de onde o nosso “essênios”.  
O Essenismo é transcrito pela primeira vez por Fílon e Flávio Josefo, onde citavam uma ordem que havia se afastado do judaísmo tradicional por motivos desconhecidos, pois seus costumes se diferenciam em determinados pontos. Iniciaram seus estudos nos séculos que vão desde o ano 150 A.E.C. a 70 D.E.C.
Dos hábitos comuns do grupo, pode-se dizer que alimentavam-se basicamente de frutas e legumes (eram vegetarianos) e que banhavam-se em águas como forma de ritual para a purificação espiritual. As toalhas submersas em água do nosso Ritual do Grau 17 são referência a isso.
Durante o domínio da Dinastia Hasmonéa (140 – 37 a.E.C.), os essênios foram perseguidos. Retiraram-se por isso para áreas desérticas, vivendo em comunidade e em estrito cumprimento da Torá de Moisés,  bem como do estudo e das práticas virtuosas descritas nos livros dos Profetas.
Méris é o nome dado pelos antigos escritores gregos a um grande lago da atual região de El Fayum, no Egito. Atualmente, é um lago salgado de tamanho bem reduzido, chamado de Birket Qarun. O faraó Amenemhat III erigiu perto de Méris um imenso complexo de edifícios e uma grande Necrópolis.

O lago simboliza o “olho da terra” por onde os habitantes do mundo subterrâneo podem ver os homens, os animais, as plantas, etc. Numa analogia, simboliza a revelação de camadas mais profundas da consciência e o voltar-se para dentro de si.
O lago de Méris era visto pelos Teólogos do Antigo Egito como uma manifestação real e terrestre da Vaca do Céu, um céu liquido onde o sol se escondera misteriosamente....um afloramento do Oceano Primordial, mãe de todos os deuses, dando vida aos humanos, a garantia da existência e da fecundidade.

O Arco-Íris: O arco-íris é símbolo do caminho e mediação entre a terra e o céu. É a ponte, de que se servem os deuses e heróis, entre o Outro Mundo e o nosso. Na Grécia, o arco-íris é Íris, a mensageira rápida dos deuses. Simboliza também, de modo geral, as relações entre o céu e a terra, entre os homens e os deuses: é uma linguagem divina. Na China, a união das cinco cores atribuídas ao arco-íris é aquela do yin e do yang, o signo da harmonia do universo e de sua fecundidade.
No contexto do Grau 17, o arco-íris é símbolo da união de contrários e também a reunião das metades separadas, a resolução. O arco-íris, ao aparecer por cima da arca de Noé, reúne as águas inferiores e as águas superiores, metades do “ovo” do mundo, como sinal de restauração da ordem cósmica e da gestação de um ciclo novo. O arco-íris é símbolo anunciador de felizes acontecimentos ligados à renovação cíclica.
Através de virtudes superiores é possível ligar o homem ao céu e aos seus Irmãos.

A Lua manchada de sangue: A Lua é símbolo de dependência (do sol, por não ter luz própria) e de periodicidade e de renovação. Também é símbolo de inconstância. Simboliza ainda os ritmos biológicos, o tempo vivo. É também o primeiro morto. Durante três noites, em cada mês lunar, ela está como morta, ela desapareceu...Depois, reaparece e cresce em brilho. Da mesma forma, considera-se que os mortos adquirem uma nova modalidade de existência. A Lua é para o homem o símbolo desta passagem da vida à morte e da morte à vida.
O sangue está relacionado com o simbolismo da vida. Em diversas escrituras antigas é visto como veículo e princípio da vida. Simboliza todos os valores solidários com o fogo, o calor e a vida que tenham relação com o sol. A esses valores associa-se tudo o que é belo, nobre, generoso, elevado. Também participa da simbologia geral do vermelho.
No contexto do Grau 17, representa que, enquanto para o supersticioso a Lua representa anúncios de catástrofes e de desgraças, para o verdadeiro Iniciado ela é símbolo de renovação, assim como o sangue derramado pela Verdade não é motivo de terror, mas sim de nobreza, de beleza, de generosidade e de elevação.

O heptágono: O heptágono está ligado ao simbolismo do número 7. Sete é a união do ternário e do quaternário. “Hepta” quer dizer “sete”, e “gonia” quer dizer “ângulo”. O número 7 é símbolo de integridade, totalidade, de plenitude e perfeição.
A marcha pelo “heptágono” está ligada à abertura dos sete selos do livro do Apocalipse, que só o Cordeiro pode abrir (Apocalipse Cap. 5 a 8).

A Balança e as espadas cruzadas: A balança é símbolo do equilíbrio, da medida, da prudência e da justiça. Associada à espada, é também a justiça, mas duplicada pela VERDADE. A espada é, assim como a balança, um símbolo axial e polar, a arma do centro. As espadas cruzadas são a defesa da justiça e da verdade, personificadas pelo princípio transcendental CENTRAL ou AXIAL.

O Arco, as flechas, o crânio, a coroa e o incenso: Apesar de terem sido suprimidos do nosso ritual brasileiro, o Arco, as flechas, o crânio, a coroa e o incenso fazem parte do simbolismo do Grau.

 Segundo as instruções de um ritual do final do século XIX, eles têm a seguinte significação:
“O arco, as flechas e a coroa significam que a palavra do Venerável e as decisões da Loja devem ser executadas com a rapidez do vôo das flechas e com a submissão que se deve ter diante das testas coroadas...a caveira simboliza um Irmão exilado de nossas Lojas...o incenso é aqui figurado para nos lembrar que a Maçonaria está espalhada por toda a terra e que sua honra é como o perfume do incenso.”
A flecha identifica-se ao relâmpago. O relâmpago é o traço de luz que traspassa as trevas da ignorância: portanto é um símbolo do conhecimento. O arco significa a tensão de onde brotam nossos desejos. Ou seja, a vontade que direciona o conhecimento para vencer as trevas.
A coroa, além de símbolo do poder do coroado, é símbolo de ligação entre o que está em baixo (o coroado) e o que está em cima (o Princípio Superior, representado pelo Céu).
Dentre diversas possíveis interpretações positivas, a que é dada no Grau 17 ao crânio é negativa. Simboliza a ausência de vida espiritual quando o maçom se afasta dos princípios cultuados nas Lojas.

As cores branca, preta, dourada e vermelha:  O branco, além de figuração de pureza, também representa a entrada no invisível, na plenitude de novas possibilidades, na transição, nos aspectos celestiais.
O negro representa a coexistência de contrários que se fundem, o ponto de partida da Grande Obra, a Nigredo, de superação dos aspectos sombrios.
O ouro é visto como o metal perfeito, símbolo solar, reflexo da luz celeste. Figura a nobreza de ação e de pensamento, conclusão da Grande Obra Alquímica.
O vermelho também está ligado com o simbolismo alquímico, a fase final da Grande Obra, a Rubedo, Obra em Vermelho. Simboliza a vida, a ação, o sangue derramado em defesa da Verdade.

O avental do Grau 17:  O avental utilizado no Brasil é fruto de uma reforma ocorrida nos EUA no começo do século XX.
O Telhador de Lausanne, traz como descrição do avental simplesmente: de seda amarela, orlado de vermelho. Nada mais. O Telhador não fala em letras hebraicas, em tetractys pitagórica e também nada diz sobre duas faixas. Fala em uma faixa branca e um colarete preto, de onde pende a jóia.
A modificação se deu nos EUA e, a princípio, constava da tetractys pitagórica com as letras hebraicas do Tetragramaton, além de uma espada na abeta.Depois, em uma das muitas modificações do ritual norte-americano, a tetractys foi invertida e as letras hebraicas do tetragramaton foram suprimidas, deixando-se apenas o yod, o que descaracterizou o simbolismo original da tetractys com o tetragramaton.

Abaddon (Apolyon) e Zabulon (Jabulum): Abaddon é o anjo da destruição no Apocalipse. É citado no Capítulo 9, versículo 11. Já Zabulon (ou Jabulon, Jabulum etc.) é objeto de muitas controvérsias. Segundo o historiador maçônico Arturo Hoyos, a palavra Jahbulon foi primeiramente usada em 1700, na França. Conforme Paul Naudon, seria a relação a uma alegoria maçônica na qual Jabulon era o nome de um explorador vivendo durante o tempo do Rei Salomão, que descobriu as ruínas de um templo antigo. Segundo as explicações de Hoyos e de Morris, dentro das ruínas o explorador encontrou uma placa de ouro sobre a qual o nome de Deus foi gravado, contudo salientam os autores, que em momento algum, da simbólica representação, é feita ligação entre o nome do explorador e o nome de Deus. Afirmam que, como existem variantes deste ritual, diferentes formas do nome do explorador também são encontradas além de Jabulom, como Guibulom.
O Masonic Information Center, em algumas de suas publicações afirma que  é provavelmente derivado de Giblim, de 1 Reis 5:18 referente a palavra gebalitas ou giblitas ou "homens da cidade de Biblos" e, segundo Hoyos, devido a "uma má interpretação das letras em hebraico", teria havia a concepção "trinitária" para o nome.  

Uma visão panorâmica do Grau 33 do REAA

Por André Otávio Assis Muniz

I. Introdução

O Grau 33, último grau do Rito Escocês Antigo e Aceito e, no Brasil, também o último Grau de outros ritos influenciados pelo Sistema Escocês (Adonhiramita e Brasileiro), é cercado de uma aura de mistério e de hiper valorização.
É comum ouvir entre maçons e não maçons a referência admirada a alguém dizendo: “- Ele é Grau 33”...
Essa admiração, ainda que justificada pela longa caminhada iniciática de alguns Irmãos portadores desse último Grau, deve ser temperada de sobriedade e razão.
Vamos dar um rápido sobrevôo sobre o Grau e, assim, tentar desfazer alguns equívocos bastante comuns em relação a ele.

II. Origem

Os primeiros documentos que citam o Grau 33 no Sistema Escocês traz a data de 1786. No entanto, é sabido que essa data não corresponde à realidade.
Tanto os chamados “Novos Institutos Secretos e Fundamentais da muito Antiga e Venerável Sociedade dos Maçons Livres Associados, ou Ordem Real e Militar da Franco-Maçonaria” quanto as “Constituições Estatutos e Regulamentos” (esses últimos datados de 1786), que dizem ter sido redigidos por Frederico II, Rei da Prússia, são falsificações.
Apesar de serem falsificações, são os documentos mais antigos e fundamentais do Rito Escocês Antigo e Aceito. Frederico II não passou nem perto deles mas, apesar disso, permanece como figura central nas alegorias do Grau.
Frederico II figura como modelo de Imperador esclarecido e iluminista . O exercício do poder foi para ele um exercício de sabedoria e de trabalho em prol dos seus governados. Sendo assim, é um tipo de arquétipo a ser seguido pelos Grandes Inspetores Gerais no governo dos Altos Graus.
Provavelmente, o Grau 33 foi criado nos Estados Unidos da América no final do século XVIII, quase início do XIX.
Há três hipóteses mais fortes para a escolha desse número:
a) Uma referência à idade de Jesus Cristo, símbolo da “caminhada da perfeição”
b) A passagem do “paralelo 33” sobre Charleston nos EUA (não é exatamente 33 o paralelo, é o  32°47’N 79°56’ mas pode ter havido uma aproximação).
c) Uma referência aos 33 membros da Guarda Escocesa que faziam a guarda pessoal do Rei da França.

III. Desenvolvimento

Originalmente, o “Rito de Perfeição de Heredom”, que seria a base do REAA, era um rito de 25 Graus.  Ao contrário do que se pensa, a maioria desses graus não tinha rituais. Eram transmitidas as lendas, as palavras e só.
O Rito de Heredom, cujo sistema já estava estabelecido na década de 1750, tinha como Grau máximo, de número 25, o de “Sublime Príncipe do Real Segredo”, "Sublime Comendador do Real Segredo".
A importância que se dá hoje à ritualística, aos interstícios etc. dos chamados “Altos Graus”, era bem pouco conhecida nos séculos XVIII e XIX.
Alguns sistemas maçônicos compactaram as lendas em um único Grau para abreviar o tempo para que se passasse o conhecimento. No Regime Escocês Retificado, por exemplo, a essência dos Altos Graus era transmitida no Grau de Mestre Escocês de Santo André, que compreende a parte central dos ensinamentos do Grau 4 ao Grau 18.  Os Graus subseqüentes, ou seja, a dita “Ordem Interna”, que compreendia os Graus de Escudeiro Noviço e o de Cavaleiro Benfeitor da Cidade Santa (CBCS, dividido em Professo e Grande Professo), têm características cavalheirescas retiradas da Estrita Observância Templária e não propriamente maçônicas.
No Rito Moderno, são nada menos que 81 Graus compactados em 5 Ordens ditas “Sapienciais” ou “de Saberdoria” (Ordres de Sagesse). Neste Rito, originalmente, não havia Altos Graus tendo em vista que era a simples transposição dos costumes da Grande Loja de Londres (dos “Modernos”) para a França.  O sistema de Altos Graus foi elaborado com base em todos os Graus praticados na França oitocentista (81 ao todo).
A Maçonaria só passaria a praticar o 3º Grau em 1724.  As primeiras Lojas em território francês seriam implantadas um ano depois, ou seja, com o Grau de Mestre recém elaborado.
Mais de 60 anos depois, por conta da necessidade de se estabelecer ordem dentro das práticas de Altos Graus nas diversas Lojas Capitulares,  se estabeleceu na França o “Grande Capítulo Geral” que, através da pena de Alexandre Roëttiers de Montaleau, estabeleceria os rituais das 5 Ordens Sapienciais do Rito Moderno.
Até que Albert Pike revisasse os rituais, já quase no final do século XIX, os “Altos Graus” do REAA também não tinham forma ritualizada.
O próprio Albert Pike recebeu, em uma única ocasião, do Grau 4 ao Grau 32, de Albert G. Mackey.
Quando foi eleito para ser membro do Supremo Conselho do Grau 33, também o recebeu por comunicação, tendo em vista que seria ele o verdadeiro autor dos primeiros rituais, propriamente ditos, do REAA.
O ritual mais antigo que se conhece do Grau 33, descoberto pelo próprio Albert Pike, traz procedimentos bastante simples em relação ao que se pratica hoje.
O REAA na época de Albert Pike era um dos menores grupamentos maçônicos existentes no mundo. Era um rito minoritário.

IV. Temática

O Grau 33 gira em torno da temática dos chamados “Graus Cavalheirescos”.
Reunido em um templo armado de vermelho com ornamentos dourados, tendo esqueletos, tíbias e crânios como adornos, o Supremo Conselho recorda o massacre de Jacques Demolay e dos templários.
A “caveira vingadora”, um esqueleto presente no lado norte da sala, portando o estandarte do Supremo Conselho em sua mão esquerda e um punhal em sua mão direita faz, justamente, alusão ao desejo de justiça para aqueles que foram vítimas das intrigas, calúnias e injustiças. Tal caveira representa, obviamente, Jacques De Molay.
A coroa imperial de Frederico II e o seu cetro encontram-se sobre a mesa do Soberano Grande Comendador que, aliás, representa o próprio Frederico. Seu auxiliar ou vigilante, se senta no Ocidente e representa Louis de Bourbon, que teria, na lenda, auxiliado a Frederico II na reforma do Rito de Perfeição de Heredom.
Em outras palavras, a coroa e o cetro representam ao poder de Frederico II que teria se transmitido aos Soberanos Grandes Comendadores para que governassem o REAA.
Coroa e cetro são símbolos de poder, de mando e de governo. Fica óbvia aqui a pretensão de “governo” sobre toda a chamada “Maçonaria Escocesa”.
Onze luzes iluminam a sala, recordando a data maçônica da extinção da Ordem do Templo, ou seja 5312 (1312 + 4000).
As divisas “Ordo Ab Chao”(Do caos a ordem) e “Deus Meumque Jus” (Deus e o meu direito), colocadas na porta do Supremo Conselho relembram :
- A ordenação e o governo dos diversos graus (que sem um centro de comando estariam mergulhados no caos e desordem);
- A ordem social dada pela sabedoria e pela moral, sem os quais a sociedade mergulharia no caos;
- Os princípios de lei natural (jusnaturalismo), ou seja, aqueles dados por uma potência superior e transcendente da natureza, representada no Ocidente cristão pela figura de ‘Deus’;
- Os princípios da lei consuetudinária e das normas positivas reguladoras do Direito (juspositivismo) que regem as sociedades, representadas aqui pelo “meumque jus”.
Os rituais variam quanto à presença de um transparente com um triângulo tendo a letra hebraica “yod” ao centro ou com o numeral 33 em seu lugar.
Os membros do Supremo Conselho são descritos como “vestidos de negro” e “armados de espada” o que se explicaria pelo luto provocado pela morte dos templários, denominados de “nossos Irmãos” e a vingança contra a Intolerância, o Fanatismo e a Ignorância que os condenaram aos tormentos e à morte.
A temática da “Justiça e Equidade”, que é trabalhada mais extensamente no Grau 31, é retomada de maneira “un passant” no Grau 33. A presença divina no Supremo Conselho, representada pelo transparente, não é temida pois, simbolicamente, os Grandes Inspetores Gerais agem com retidão e justiça, dentro das leis humanas e divinas.
O símbolo mais universalmente conhecido do Grau 33 é a águia bicéfala, segurando uma espada entre as garras e tendo a coroa imperial entre as duas cabeças.
Esse símbolo é oriundo, no caso do REAA, de mais uma referência à Prússia. Trata-se da águia negra bicéfala da Prússia, com algumas modificações.
A águia prussiana tem nas garras um globo encimado por uma cruz e uma espada. A águia do Grau 33 agarra apenas uma espada com ambas as garras e, por vezes, nessa espada, há um filactério com o dístico “Deus Meumque Jus”.
Ao longo do tempo, com a imensa “criatividade” de alguns dirigentes do REAA, a águia foi se transformando e ganhando novas (e cada vez mais forçadas) características e interpretações.

V. Inovações (e deformações)

Se compararmos diversos rituais do Grau 33 veremos que, em pouco tempo, foram sendo introduzidas mudanças e “novidades” aqui e ali.
Uns falam em triângulo com o vértice para baixo, outros falam em vértice para cima. Uns dão importância a que haja uma estrela de nove pontas, constituída de 3 triângulos eqüiláteros, com cada uma das letras da palavra “Sapientia” nas mesmas. Outros nem citam essa estrela.
Uns rituais falam no transparente com o triângulo (com a ponta para baixo ou para cima) no meio de um resplendor com o “yod” , ao qual se dá um papel importante por ser o “nome de Deus”. Outros falam do numeral 33 e não citam o “nome de Deus”.
Nos EUA, a águia bicéfala negra prussiana virou uma águia americana de duas cabeças com a coroa imperial (?) por cima.
Além disso, há algum tempo, resolveram introduzir “ramos” nos bicos da águia, como se ela fosse um tipo de “pomba da paz”.
No Brasil, há alguns rituais que afirmam que as duas cabeças representam “Ordem e Progresso”...Ou seja, o ritual do Grau 33 toma contornos positivistas e Comte se torna um novo “ideólogo” para os Supremos Conselhos.
Outros rituais foram sendo modificados para se “ajustarem” aos hábitos de uma ou outra Obediência Maçônica. Um “figurão” qualquer inventava uma inovação e lá se iam a modificar todos os rituais.
Em fotos bem antigas, de meados do século XIX, oriundas do Supremo Conselho de Portugal, vemos os Grandes Inspetores Gerais vestindo o avental e o colar, ou a faixa e o avental. Em fotos do começo dos século XX ou do final do XIX, o avental some e dá lugar somente à faixa ou ao colar.
Os aventais se tornam peças de museu e a arrogância de dizer que “não é preciso mais avental porque o trabalho iniciático já está acabado” se torna uma justificativa comum.
Posteriormente inventaram o uso de uma “faixa abdominal”, um tipo de cinta com um lacinho ou uma fita de premiação com um rosetão com fitinhas dependuradas. Tal adorno DEVERIA ser usado somente se o Grande Inspetor Geral estivesse revestido de túnica vermelha, coroa e capa. Nunca sobre o paletó...  
Originalmente, o Soberano Grande Comendador se revestia de uma túnica de cetim carmesim, bordada e debruada de branco e a coroa Imperial era vestida por ele. Hoje, a coroa fica sobre a mesa, assim como a espada que ele deveria portar.
O barrete com a “Cruz de Lorena” é mais um acréscimo. Ele já teve a águia bicéfala em vez da referida cruz e ganha cores diferentes em acordo com a “criatividade” dos chefes dos Supremos Conselhos. Outras cruzes, cada vez mais complexas e cheias de traves, vão modificando os paramentos que, aos poucos, parecem uniformes de bandas marciais ou uniformes dos stewards de hotel...
Um capítulo à parte são as patentes do Grau.
De documentos bastante sóbrios que continham apenas os elementos essenciais indicados nas leis do REAA, as patentes ou diplomas do Grau 33 foram se tornando verdadeiras “overdoses visuais”, com desenhos ornamentais de cores fortes, faixas impressas, águias carnavalescas e um mau gosto à toda prova.
Se chegar ao Grau 33 deveria ser uma forma de obter uma visão completa do sistema ritualístico do REAA, passou a ser um tipo de “formatura” às avessas, onde os “professores” que lá estão sem saber grande coisa, vão modificando as características do sistema até que ninguém entenda mais porque os elementos simbólicos e alegóricos devem estar nos graus.
Como se não bastasse tudo isso, ainda há a mania de secretismo em torno do Grau. Em vez de se dar a oportunidade para que pessoas sérias, capacitadas e interessadas pesquisem sobre o Grau  em suas diversas versões, publiquem suas pesquisas e , dessa forma, sejam incrementadas as informações históricas e simbólicas que há sobre ele possibilitando uma maior preservação dos seus elementos essenciais, há dirigentes que ainda não se deram conta que desestimular a pesquisa, no século da Informação, da internet, da conectividade móvel e imediata, não vai “preservar” qualquer “segredos”, que, aliás, já são de domínio público há muito tempo, mas apenas fomentar a desinformação e a invencionice.
Graças a essa mentalidade, que privilegia a manutenção de um “fechamento” epistemológico, as informações acabam viciadas em um mesmo meio, com os membros de um ou outro Supremo Conselho acreditando que só existe uma versão do Grau, a sua própria...E pior, acreditando que, assim, estão “preservando” alguma coisa.
A cada mudança e a cada invenção introduzida nos rituais por indivíduos ineptos que só tem poder burocrático mas nenhum conhecimento efetivo, um pedaço dos rituais vão se perdendo. Dessa maneira, cada geração de novos Grandes Inspetores Gerais vai recebendo uma visão mais mutilada do Grau 33. Sem que hajam estudos sérios, análises comparativas etc., não há possibilidade de preservação coletiva dos elementos mais autênticos do Grau.
Tal situação tende a ser enormemente agravada quando os portadores do Grau se sentem tão “elevados” que não precisam mais estudar...Infelizmente essa é uma situação bem recorrente.

VI. Grau Administrativo?

Há um consenso quase geral de que o Grau 33 seria um grau puramente administrativo.
Apesar de haver elementos claramente voltados ao “governo” da chamada “Alta Maçonaria Escocesa”, ou seja, elementos administrativos,  o grau traz também elementos morais e simbólicos evidentes.
O binômio “Direito Natural” ou “divino” e “Direito Positivo” ou “social” é tratado de maneira bastante equilibrada através da correta compreensão dos dísticos.
A busca constante pela justiça e o combate à Ignorância, ao Fanatismo e à Intolerância dão o tom da “vingança”. Em outras palavras, não se trata de uma “vingança cega”, mas sim de uma vingança temperada pela razão, pelo pensamento e pelos valores morais defendidos pela Maçonaria.
A cor vermelha, cor do REAA, que faz referência ao sangue derramado em prol da verdade, cor da cruz pátea dos templários, à completude da Grande Obra Alquímica – a ‘Obra em Vermelho’ (a rubedo), também é símbolo do “fogo interior” da Sabedoria, da Ciência e do Conhecimento Esotérico interdito aos não iniciados.
O vermelho também incita à ação, é a imagem do ardor que deve animar aos Grandes Inspetores Gerais a uma ação transformadora, tanto interna quanto externamente.
Os imperadores bizantinos se vestiam inteiramente de vermelho e existiam leis que proibiam o uso de esmalte rubro nos brasões, pois era cor exclusiva do Imperador. Assim, indica também poder.
Atingir a “Obra em Vermelho” (rubedo) é o acesso aos “Grandes Mistérios”.
Sobre o vermelho estão representados ossos e crânios.
Os ossos são símbolo de firmeza, de força e de virtude. Também representam o “retorno” e suas possibilidades. No simbolismo bíblico, a revivificação dos “ossos secos” indica a possibilidade de uma restauração. De fato, em algumas culturas, a “essência da vida” encontra-se no tutano. O núcleo dos ossos seria, dessa maneira o “germe” dessa restauração.
O crânio é símbolo do “centro espiritual”, é a “abóbada celeste” do corpo humano. Era utilizado pelos alquimistas em suas operações de transmutação.
Na Maçonaria se reveste do simbolismo do ciclo iniciático: a morte corporal, prelúdio do renascimento em um nível de vida superior.
A presença da coroa, ainda que, em um nível mais imediato, invoque a memória de Frederico II, também simboliza valores que sobrepujam à cabeça, cimo do corpo humano, ou seja, assinala um caráter transcendente de uma realização bem sucedida. Ela une o “coroado” ao que está acima dele e também ao que está embaixo.
A coroa também simboliza dignidade, poder, realeza, o acesso a níveis superiores.
No simbolismo cabalístico, o ápice da “Árvore da Vida” é ‘kether’, ou seja, “coroa”. Exprime o Absoluto, o infinito e sem limitações.
As coroas divinas ou régias eram objeto de culto, unicamente manipuladas por iniciados nos mistérios, eram consideradas seres carregados de poder.
O cetro simboliza também a força e a autoridade, é um modelo reduzido de um grande bastão de comando. É uma “vertical absoluta” que simboliza o homem enquanto tal,  a superioridade desse homem feito chefe e o poder recebido de cima.
É o modelo reduzido da coluna do mundo, o eixo em torno do qual se organiza uma coletividade ou sociedade.
Na Grécia Antiga, o certo simbolizava o direito de fazer justiça e, por isso, pertencia à panóplia das insígnias consulares.
O esqueleto presente no Supremo Conselho é símbolo das operações que precedem as transmutações. Não representa uma morte estática, um estado definitivo, mas uma morte dinâmica, anunciadora e instrumento de uma nova forma de vida.
Seu “sorriso” irônico e seu ar pensativo, simboliza o conhecimento daquele que atravessou a fronteira do desconhecido, daquele que, pela morte, penetrou no segredo do além.
De acordo com Apuleio, na antiguidade circulavam selos ou estatuetas representando um esqueleto, que serviam para realizar operações mágicas. Tais esqueletos eram, supostamente, a imagem de Hermes, deus psicopompo que usufruía do privilégio de pode descer aos infernos e daí voltar.
Petrônio, em seu Satiricon, coloca um esqueleto de prata com articulações móveis em um banquete para simbolizar a morte em geral e a brevidade da vida. Essa visão era destinada a fazer com que os convivas aproveitassem mais aquele momento, tendo em vista que todos os prazeres são efêmeros.
A águia-bicéfala, símbolo onipresente no Grau 33, nas antigas civilizações era símbolo do poder supremo. Nas tradições xamânicas da Ásia Central, é frequentemente representada no topo da coluna do Mundo, situada no meio das aldeias.
A origem da águia-bicéfala é, provavelmente, hitita. Foi retomado pelos turcos seldjúcidas e, destes, foi copiado pelos europeus nas cruzadas para chegar por esse meio indireto às armas imperiais da Prússia.
A duplicação da cabeça reforça o simbolismo da autoridade representado pela águia, rainha das aves, mensageira da mais alta divindade uraniana e do fogo celeste – o sol, que só ela pode ousar fixar sem queimar os olhos. Essa característica simboliza a percepção direta da Luz intelectiva. É símbolo da contemplação, daí a atribuição da águia a São João Evangelista.
Exprime a ascensão e a realeza e é graças a essa segunda interpretação que se tornará símbolo romano do Império e também do Santo-Império medieval.
Dotada de força solar e uraniana (celeste), que a potência com que levanta vôo evidencia, a águia torna-se, em decorrência disso, o pássaro tutelar, o iniciador e o psicopompo.
Na Idade Média, o vôo em descenso da águia era visto como sinal da descida da luz sobre a terra.
A águia romana é essencialmente a mensageira da vontade do alto. Na Grécia, segundo Píndaro, a águia dorme pousada no cetro de Zeus, cujas vontades faz conhecer aos homens.
Fica bastante óbvio que, se compreendermos todos esses símbolos dispostos no Supremo Conselho do Grau 33, entenderemos perfeitamente a mensagem do Grau e poderemos nos esforçar por atingirmos a iniciação REAL nele.

VII. Conclusão

Não tivemos a pretensão de fazer uma análise aprofundada sobre o tema mas, tão somente, apresentar elementos gerais concernentes ao Grau 33 do REAA.
O rito de Iniciação no Grau demandaria análises simbólicas um pouco mais extensas e, por isso, resolvemos não comentá-lo nesse texto.
As funções e as atribuições dadas ao Grau 33 nas diversas fases de seu desenvolvimento, passando pelo famoso “Congresso de Lausanne” (1875), demandariam também a análise de certos desdobramentos históricos o que tornaria o texto demasiadamente longo. Certamente não é esse o objetivo de um texto que se pretende apenas uma visão panorâmica.
Esperamos, em outras oportunidades, analisar aspectos mais particulares do Grau 33, quando teremos ocasião de nos estendermos mais em considerações de caráter histórico e simbólico.