Irm. André Otávio Assis Muniz
I. Introdução Geral
Este Grau recebeu diversos nomes
em diversos manuscritos diferentes. Ele é um dos mais antigos da Maçonaria
Francesa e já era conhecido em Paris desde 1.745 sob o nome de Preboste e Juiz
(Prévôt et Juge). Praticado em Metz em 1.761, a antiguidade deste grau é
atestada por figurar no Antigo mestrado bordelaise em 1.750 e no Rito de
Perfeição e no Grande Eleito de Londres. Se encontram 3 denominações para este
grau:
- Perfeito Mestre Irlandês;
- Poderoso Irlandês;
- Preboste e Juiz.
Esta última denominação do grau,
a de Preboste e Juiz, faz com que tenha uma denominação dupla, contrariamente
aos outros Graus de Perfeição que têm nomes únicos.
Furetière, em seu “Dictionnaire
Universel” define o Preboste como um juiz subalterno de cidades e vilas.
Esta definição poderá fazer pensar que a dupla designação do grau é um
pleonasmo. Na Idade Média, o Preboste tinha a função da administração dos bens
e das receitas de um mestre, de um senhor leigo ou eclesiástico. O “Le
Dictionnaire du Moyen Âge” considera que o Preboste, além de ter poder
judicial, era o representante do rei em uma determinada fração de sua
propriedade. No Grau de Preboste e Juiz, no entanto, as duas funções devem ser
analisadas com maior cuidado pois aparecem como coisas separadas.
O Preboste detém a chave do cofre
com os planos do Templo e a urna contendo o coração de Hiram, enquanto o juiz
desempenha sua função utilizando a balança para fazer seus julgamentos.
O candidato a este grau é
investido de uma dupla função: ele deve fazer a justiça e é o guardião dos
planos destinados aos Mestres Maçons e do coração embalsamado de Hiram.
Este grau ensina que governar e
ter responsabilidades de comando implica em conhecer e agir com justiça,
equidade e imparcialidade.
O ritual evoca um tribunal que
fornece ao Rei Salomão o meio de restaurar a ordem necessária permitindo aos
obreiros continuar a construção do Templo interrompida pela desaparição do
Mestre.
O bem agir caminha junto com a
vontade de uma ação leal e sincera.
II. Tema do grau
É muito importante ter em vista
que os graus maçônicos têm como base a fontes diversas e que, tal origem pode
deixar bastante misturados os fatos apresentados nas lendas.
Neste grau, o presidente da Loja
representa Tito que, ao contrário do que é dito no ritual brasileiro à página
48, de que seria um nome sem “qualquer significado conhecido” possivelmente
deriva de um patronímico romano relacionado com o latim titulus, que
significa “honrado, respeitável”, ou seja, um nome simbólico para o decano
dos Mestres Irlandeses, príncipe dos Harodim, ou chefes e condutores dos
trabalhos em número de 3.300, que Salomão estabeleceu sobre os obreiros do
Templo, em acordo com o 1º Livro dos Reis, 5, 16 (Biblia Sacra Vulgata, Liber
Malachim – III Rg 5,16):
“absque praepositis qui praeerant
singulis operibus numero trium milium et trecentorum praecipientum populo et
his qui faciebant opus (e também prepostos em número de três mil e
trezentos que comandavam as pessoas e supervisionavam o trabalho”).
Já o nome “Zadoc”, é, na verdade,
uma corruptela de Tzadek ou Tzadok, que significa em hebraico, “Justo”. Sendo
assim, longe de não ter “qualquer significado conhecido”, Tito Zadoc significa
Justo Honrado/ Respeitado.
O ritual em uso no Brasil comete
mais alguns erros grosseiros em relação ao relato bíblico. Na edição de 2.014,
p.47, “A lenda do Grau 7 Preboste e Juiz”, é dito que os operários eram cerca
de 3.600 e que Salomão resolveu instituir um tribunal composto de sete Prebostes
e Juízes. O relato bíblico diz, no entanto, que o número de supervisores era de
3.300 e que Salomão arregimentou 30.000 trabalhadores de todo o Israel. Além
desses, Salomão dispunha de 70.000 carregadores e 80.000 cortadores de pedra
nas colinas. Ou seja, 183.300 envolvidos que o ritual reduz a 3.600, cometendo
um erro de “apenas” 179.700 trabalhadores no total e de 3.293 prebostes...Seria
interessante que os responsáveis pela ritualística do R.E.A.A. tivessem o
cuidado de ler as fontes dos relatos contidos nos rituais para que fosse
esclarecido, no próprio ritual, que o número 7 é simbólico, e não o número
fidedigno ao que se encontra no relato bíblico. Tais inexatidões, caindo nas
mãos de conhecedores da Bíblia, passam a impressão de uma Maçonaria inculta e
descuidada.
No decorrer da iniciação deste
grau, o candidato executa 7 viagens, ou 4, de acordo com a variação dos
rituais. No coração de cada uma dessas viagens, é exposto algum meio de bem
exercer a justiça. Ele é interrogado sobre a maneira que a concebe, sobre os
deveres que deve preencher e sobre suas aptidões para com essa função.
Este grau é, também uma cerimônia
de homenagem funerária em memória do Mestre desaparecido. Isto não acontece no
ritual atual em uso no Brasil.
O tema da lenda é centrado sobre
a construção do Templo relatada no Livro dos Reis e em Crônicas.
Depois da morte de Hiram, Salomão
nomeia sete Prebostes e Juízes. Os prebostes são encarregados de examinar os
planos elaborados pelos Arquitetos, verificando sua conformidade com os
projetos elaborados pelos Grandes Mestres. As reuniões se dão na câmara do meio
do Templo. Os planos dos edifícios e as contas devem ser conservados em um
cofre de Ébano, cuja chave é conservada pelos Prebostes e Juízes.
III. A moral do grau
O tema moral central do grau é a
JUSTIÇA, na decisão e no julgamento.
Todo aquele que é investido com o
poder de julgar deve ser imparcial, sem qualquer consideração pessoal à força
dos poderosos, ao suborno dos ricos, ou às necessidades dos pobres.
Em nossa época, onde superabundam
as informações sem comprovação, os boatos, as intrigas públicas através das
redes sociais, o grau de Preboste e Juiz ensina que o maçom deve ouvir
pacientemente e pesar cuidadosamente os fatos e argumentos oferecidos. Não deve
concluir nada precipitadamente, nem formular opiniões e sentenças antes de ter
ouvido a todas as partes envolvidas.
Albert Pike, em sua obra “Moral
and Dogma of Ancient and Accepted Scotish Rite”, ensina que nas nossas relações
com os outros há dois tipos de injustiça: a primeira é a daqueles que lesam os
outros e a segunda é a daqueles que podem prevenir uma lesão nos outros, feita
por terceiros, mas não fazem. Dessa maneira, a injustiça ativa pode ser feita
de duas formas – pela força e pela fraude, ambas absolutamente repugnantes ao
deve social, sendo a fraude a mais detestável.
Outro fato que devemos ter em
mente é que a injustiça pode ser reparada, mas nunca desfeita. Podemos nos
arrepender, pedir perdão a quem a sofreu, formular o firme propósito de não
mais agir de forma injusta etc., mas não podemos desfazer aquilo que já foi
feito e cujos efeitos já deixaram as marcas no corpo e/ou na alma.
A Maçonaria, através de seus
ensinamentos, refreia as pessoas da comissão de injustiças. Para o verdadeiro
maçom, trapacear, levar vantagem no comércio, no foro, na política etc., não é
menos culpável do que roubar. Deliberar mentiras não é crime menor que o
perjúrio, caluniar não é menor do que usurpar e seduzir para o mal não é menor
que o homicídio.
Pensemos em quanta falta faz
hoje, à Maçonaria e à sociedade de forma geral, a aprendizagem sincera das
lições desse Grau. Quantos “Irmãos” carregados de graus e de títulos, cheios de
poderes maçônicos e cargos, só se servem deles para a obtenção das mais
profanas vantagens motivadas pelos mais baixos e condenáveis interesses?
Com quanta facilidade e com
quanta irresponsabilidade são propagadas fofocas, inverdades, calúnias,
injúrias e difamações de maçons para com outros maçons? O que dizer das
manobras sujas, das campanhas difamatórias, das trocas de acusações etc., às
quais assistimos em cada período eleitoral dentro da Ordem?
IV. O Simbolismo do Grau
IV.1. A balança
Na mitologia grega, Themis, Deusa
da Justiça, tem por atributo a balança que permite julgar com equidade. Também
Zeus pesa com uma balança o destino dos homens antes de lhes atribuir. No
manuscrito da Franco-Maçonaria 76, na Biblioteca Nacional Francesa, a
utilização da balança é definida da seguinte forma:
P. O que haveis encontrado na
Loja?
R. Uma balança.
P. Que significa ela?
R. A exatidão com a qual devemos
desempenhar nossas funções, e a justiça com a qual devemos decidir sobre as
diferenças que surgirão entre os obreiros.
Significados complementares são
dados por outros manuscritos, entre eles o de Lyon, 5.921-5:
P. Que significa a balança?
R. A exatidão e a equidade com a
qual devemos desempenhar nossas funções, pois somos encarregados de finalizar
amigavelmente todas as diferenças que surgirem entre os obreiros do Templo
sobre os quais nós fazemos inspeção.
O manuscrito de Avignon, 30.083,
dá como resposta:
R. Eu farei a mais exata justiça
a todos os obreiros do Templo, em conformidade com a balança que me foi dada
por emblema.
Um mestre deve se esforçar para
fazer a justiça com toda a objetividade e equidade, buscando a verdade em todas
as situações. A balança é um símbolo de equilíbrio e exatidão. Atributo do
preboste e juiz, se encontra nela o símbolo do nível, que é o emblema do
Segundo Vigilante na Loja Azul. A balança exprime a lei do equilíbrio universal
de onde os fundamentos de sua estabilidade apresentam a imagem fixa dos dois
pratos imobilizados no mesmo nível. Os dois pratos da balança trazem numerosas
correspondências simbólicas: como força de polos opostos e complementares. O
braço e o eixo da balança formam um “T”; este símbolo faz alusão à coluna do
meio da árvore da Sefirotes. Os dois lados do braço representam o rigor ou a
força e a misericórdia ou clemência. Este símbolo do “T” se reencontra no sinal
do preboste e juiz.
A balança dada por Salomão ao
intendente dos edifícios é símbolo de estabilidade, manifestada pela lei do
equilíbrio posta em ato através de sua manifestação.
IV.2. A chave de ouro
A chave de ouro é apresenta da
como tendo uma dupla função: de um lado, ela dá acesso à urna onde está o
coração de Hiram (o plano ideal da perfeição); de outro, ela permite abrir o
cofre que contém os planos do Templo, o plano da prática:
P. Que significa a chave?
R. Que somos nós que sabemos onde
repousa o coração de nosso respeitável Mestre Hiram.
O simbolismo da chave está
evidentemente relacionado com seu duplo papel de abertura e fechamento. É, ao
mesmo tempo, um papel de iniciação e de discriminação. O poder das chaves é o
que lhe faculta ligar ou desligar, abrir ou fechar. Na terminologia hermética,
as chaves aparecem como emblemas da autoridade espiritual e da função régia,
também dos grandes mistérios e dos pequenos mistérios. No Japão a chave é
também símbolo de prosperidade, uma vez que abre o celeiro de arroz. Possuir a
chave significa ter sido iniciado. Indica não só a entrada num lugar, cidade ou
casa, mas acesso a um estado, morada espiritual, ou grau iniciático.
Nos contos, como nas lendas,
muitas vezes se mencionam três chaves: elas introduzem sucessivamente em três
recintos secretos, que são outras tantas antecâmaras do mistério. De prata,
ouro ou diamante, elas marcam as etapas da purificação e da iniciação. A chave
é, aqui, o símbolo do mistério a penetrar, do enigma a resolver, da ação
dificultosa a empreender, em suma, das etapas que conduzem à iluminação e à
descoberta.
IV.3. A arca de ébano
A arca é de madeira de ébano,
matéria vegetal, caracterizada por sua dureza, sua densidade e sua cor negra.
Esta arca contém o segredo da construção pelos planos que detém. Ela evoca a
ideia de que o corpo físico do arquiteto está entregue à putrefação depois que
a carne deixou os ossos, devido à sua cor negra.
A arca de ébano relembra a terra,
destinada a preservar as coisas que merecem ser preservadas, como os tesouros.
O simbolismo aqui tem por base dois elementos, o fato de nele se depositar um
tesouro material ou espiritual, e o fato de que a abertura da arca seja o
equivalente de uma revelação. Aquilo que se depõe na arca é o tesouro da
Tradição, um instrumento da sua revelação e da sua comunicação com o céu, e é
este o motivo pelo qual os imperadores da China selavam em arcas, no cume do
monte Taishan, as súplicas endereçadas ao Soberano Celeste. A revelação divina
não pode ser levianamente despida de seus véus. O cofre não pode ser aberto,
senão na hora providencialmente estabelecida, e só pelo detentor legítimo da
chave. A abertura ilegítima do cofre é cheia de perigos.
V. Conclusão
Há muito mais a se falar e
estudar sobre este Grau. No entanto, o atual formato de nossa ritualística
impede que haja um tempo maior para se estudar cada grau como deveríamos poder
fazer.
Gostaríamos de falar sobre as
modificações nos paramentos e outros muitos detalhes que, infelizmente o tempo
não nos permite. Convidamos os Irmãos à pesquisa!
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