Julius Evola
Tradução: Marcelo D. Prati
As
antigas tradições estavam de acordo com a afirmação de que o nome de Itália, o
qual posteriormente deveria designar toda a península apenina, originalmente
designava apenas sua parte meridional. Quanto ao significado da palavra,
partindo de várias pesquisas, como aquela do notável romanista Franz Altheim,
concluímos com suficiente segurança que Itália significa “o país dos bois” ou
dos “touros”. Tal termo não deve contudo ser preso em seu simples sentido
literal; dentre outras razões, é pouco provável que o país assim designado
fosse caracterizado por uma particular abundância de rebanhos, tão grande que
fosse capaz de justificar tal denominação. O tema do touro deve ser, mais que
isso, relacionado ao plano religioso. As pesquisas que temos destacado, se
referem efetivamente a tal plano. É confirmado, entre tais antigas populações,
o culto do deus-touro e a presenta de seu símbolo na arte funerária. Alguns
cepos itálicos se consideravam eles próprios como “touros” e usavam elmos com
chifres taurinos. Os guerreiros que combatiam portando semelhantes elmos deviam
sentirem-se como “touros”. Esses lutavam no signo do deus-touro, o qual não é
privado de relações com o próprio deus Marte arcaico: quase imagens diretas
daquele deus.
Os
relatos sobre o deus-touro na Itália se estendem, além disso, à Etrúria e
particularmente à Sardenha, enquanto em Roma existiram traços, por exemplo, o
nome de algumas pessoas (a gens Vitellia)
e em jogos rituais com touros ou sacrifício de touros – os antigos taurii ludi confirmados por fragmentos
de inscrições e oferendas aos deuses inferiores. O conjunto de tais
considerações é de particular importância para a história das origens itálicas.
É
de fato algo bem conhecido entre os estudiosos de história das regiões que o
culto do deus-touro foi comum na mais antiga civilização mediterrânea. Tendo
por particular centro Creta (onde se encontra também o modelo dos destacados
jogos sacros com os touros: um tipo de corrida ritual pré-histórica),
estendendo-se por um lado até ao litoral asiático e tendo do outro lado
ramificações que chegam aos Baleares e à própria Espanha.
Aparenta-se
assim quase certa a relação da civilização itálica pré-romana, onde ocorre o motivo
do deus-touro e onde o mesmo termo “touro” daria nome ao país, ao ciclo daquela
antiga civilização “mediterrânea” que precederia a civilização propriamente
grega e, de modo geral, indo-europeia. Mas nas pesquisas sobre suas origens,
tal constatação não constitui mais que um resultado parcial. Os povos, que de
modo mais generalizado foram chamados de itálicos, que se silenciaram depois de
Roma, confirmam também um componente étnico diverso, não redutível ao antigo
substrato “mediterrâneo”. Tal elemento heterogêneo se conecta com grande
probabilidade a migrações pré-históricas, em nossa península.
É
mérito do autor acima indicado, Altheim, ter posto em destaque a importância
que, nessas pesquisas, possuem as inscrições e desenhos sobre rocha encontrados
em Val Camonica. Esses constituem um dos poucos traços, que restam quase
intactos, de tais antigas migrações. É incontestável a afinidade de tais traços
– falando do estilo e dos tipos de símbolos – com aqueles que se encontram não
apenas na Europa central, mas também na arte rupestre sul escandinava. Um ponto
particular de merece ser levado em consideração: enquanto na arcaica
civilização mediterrânea, a qual foi o próprio deus-touro, o elemento feminino
(das mães, das mulheres divinas) teve particular destaque, um certo elemento
falta de todo nele, nos traços de Val Camonica e naquelas civilizações nórdicas
afins, onde predominam, em vez disso, símbolos solares e astrais. A diversidade
dos símbolos deve ter correspondido a uma diversidade étnica; ondas de povos
indo-europeus devem ter adentrado àquela, que era a “terra dos touros”, como
expoentes de um espírito diferente.
Ao
próprio Altheim se deve o esboço de um interessante paralelismo. Foi o
movimento dos povos ilírios que provocaram a migração dos cepos que, em ondas
sucessivas, adentraram à Grécia e à área do Egeu, criando, de encontro às
antigas formas “mediterrâneas”, ou em interferência com essas, a civilização
propriamente helênica. A última de tais ondas foi aquela dórica e a sua
conclusão foi Esparta. Assim, o mesmo movimento dos ilírios, que avançaram
também na região do Veneto, forçando os cepos já imigrados na Itália, os quais
conectamos aos traços de Val Camonica, a uma nova marcha na direção do Sul.
Tem-se então na Itália, um análogo da migração dórica. E como essa se conclui
com Esparta, assim a imigração itálica, sendo através de eventos mais complexos
e de mais dificultosa reconstrução, se conclui com Roma.
O
paralelismo que diz respeito a dureza de vida, de ética guerreira, de virtude
viril, incontestavelmente existente entre Esparta e a mais antiga Roma, parece
convalidar “a posteriori” tal sugestiva hipótese. Por um ciclo, ao mesno, por
obra de Roma, a Itália não seria uma província da arcaica civilização
“mediterrânea” do deus-touro e das divindades femininas ligadas à terra. Se
Roma reaviva partes notáveis da antiga herança itálica, a essas imprime uma
forma própria e suscita um espírito diferente. Como na Grécia, e também, em
parte, por influência grega, dos deuses da terra e das profundezas inferiores,
a ênfase foi mudada lentamente na direção daqueles luminosos do céu e do Estado
- até o período de sua decadência.
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