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sábado, 30 de julho de 2016

Maçonaria: O desvio revolucionário

Por André Otávio Assis Muniz

A Franco-Maçonaria nasce no século XVII, como um movimento de teor conservador. 

A Escócia, provável berço de nascimento das primeiras lojas maçônicas, passava por um período de valorização da identidade nacional e cultural escocesa (e consequentemente celta) e também de franca repulsa ao que era visto como "imposição estrangeira", incluído aí o papa e o rei da Inglaterra. Isso não nasceu "do nada". Desde o Renascimento, crescia o anseio de busca por elementos esquecidos durante o período medieval.
Com a queda do Império Romano do Ocidente (480 da E.C.), iniciou-se a Idade Média, marcada por um acentuado "descolamento" dos valores da Antiguidade Greco-Romana, vista como "pagã" e, portanto, inferior a tudo que tivesse nascido cristão.

O período posterior, o Renascimento, foi marcado como a tentativa de se valorizar aquilo que havia de belo e de superior na cultura greco-romana pré-cristã. Obviamente, muitos desses valores clássicos entravam em conflito aberto com as idéias do cristianismo escolástico medieval.

O que é preciso que fique claro é que, impulsionados por um desejo de retorno aos esplendores da Antiguidade Clássica, muitos pensadores passavam a rejeitar o pensamento medieval e a supervalorizar o que lhe era anterior: Os filósofos gregos, a arquitetura clássica, as belas-artes, a literatura pré-cristã etc., passaram a ser vistas como um "modelo" idealizado que, muitas vezes, batia de frente com as idéias da Igreja Romana. Nesse "caldo cultural", aqui e acolá, surgem vozes rebeldes à hegemonia católica romana e, utilizando-se do momento da Reforma Protestante, unem esses ideais a um discurso com aparência protestante, para não chocar a uma sociedade ainda profundamente influenciada pelas idéias cristãs. Assim, vemos surgir na literatura do período uma exótica mistura de elementos da antiguidade hermética, do protestantismo e do pensamento racional grego. Em livros como "O Manifesto Rosa-Cruz", "Fama Fraternitatis", "As Bodas Alquímicas de Christian Rosenkreuz", "Nova Atlântida", "A Mônada Hieroglífica", "O Teatro Alquímico", "A Filosofia Oculta" etc., se misturam todos esses elementos.

A Franco-Maçonaria é filha desse período. Ela não vem da Antiguidade e nem é uma continuação histórica das guildas medievais de pedreiros. É algo novo que surge nesse momento de intensa atividade intelectual. A princípio, motivada pelos ideais de fazer uma humanidade "melhor e mais esclarecida", a Franco-Maçonaria era monarquista, legalista e profundamente ligada à idéia de culto à Antiguidade Clássica e seus modelos. Prova disso é a plêiade de monarcas, imperadores e "déspotas esclarecidos" que foram iniciados nela. Mais que isso, é notável que a primeira Constituição dos Franco-Maçons (dita "de Anderson") era dedicada ao Duque de Montagu e cita como Grão-Mestre o Duque de Wharton.

A Franco-Maçonaria francesa, considerada a mais "revolucionária" de todas, em seu período inicial, também era profundamente ligada ao regime monárquico. O Rito Francês, ou Moderno, foi oficialmente instalado no Grande Oriente da França por ninguém menos que o Duque de Chartres, Louis Felipe d'Orleans.

Cabe notar também que o dia 14 de Julho de 1789 não foi "o fim da monarquia francesa", mas sim a inauguração da MONARQUIA CONSTITUCIONAL. A Revolução Francesa veio depois e foi, essencialmente, fruto dos interesses da burguesia e não "do povo" francês. Ao contrário do que se pensa, muitos franco-maçons franceses eram girondinos, ou seja, defensores da Monarquia Constitucional. Aliás, um dos maiores defensores do Ancién Regime, considerado por muitos como um visceral reacionário, também era franco-maçom: Joseph de Maistre.

Outro dado interessante é que, até hoje, o Grão-Mestre da Grande Loja Unida da Inglaterra é o Duque de Kent.

Muito bem. Fiz todas essas considerações prévias para demonstrar que, em si mesma, a Franco-Maçonaria nada tem de "revolucionária", de "anti-tradicional" ou de "anti-conservadora". Agora passemos ao período da "infestação".

Chamo de "período de infestação" àquele que se estende do final da Monarquia Francesa (1792) até os dias atuais. Algumas lojas maçônicas francesas, que eram compostas por burgueses, desejosos do fim da monarquia e buscando alterar a ordem social com base no capital econômico e não mais nos títulos de nobreza, começaram a servir de local de reunião para a discussão de planos revolucionários. Alguns intelectuais radicais, partidários dos jacobinos e dos cordeliers (a esquerda revolucionária da Assembléia Legislativa) eram também franco-maçons.

Obtida a vitória da esquerda revolucionária, esses franco-maçons, com o imenso poder de influência que o novo regime lhes dava, propagavam entre seus pares que a República, o Progressismo, e a ruptura com o passado eram "ideais maçônicos".

A Igreja Romana que, a princípio, combatia a Franco-Maçonaria por seu "paganismo", agora a via como um local onde as pessoas se reuniam para tramar contra a Igreja e o Trono...

A adoção da tríade revolucionária de "Liberdade, Igualdade, Fraternidade" pelas lojas maçônicas em substituição ao tradicional "Vivat, Vivat, Semper Vivat", ajudou a tornar as coisas ainda mais confusas. Sendo assim, por motivos diferentes, a aversão entre católicos romanos e franco-maçons teve continuidade.

A Franco-Maçonaria continuou sendo infestada por ideologias exógenas nos séculos seguintes. Já no próprio século XVIII, alguns judeus e cristãos judaizantes invadiram as lojas francesas com sua "teurgia" e sua "cabala-cristã".  Os rituais das Lojas, antes simples procedimentos simbólicos que traziam lições morais, foram ganhando aspectos religiosos, judaicos e constantes referências ao simbolismo hebreu.Na Contituição de Anderson aparecem numerosas referências bíblicas, mas com um enfoque bem cristão  e bem mesclado ao paganismo (referências aos gregos, à Thule etc.). Já nas doutrinas judaizantes, surge um tipo de culto judaico no interior das Lojas onde são reproduzidos os artefatos do culto hebreu (Arca da Aliança, Altar dos Perfumes, Vestes Sacerdotais hebréias etc).

No século XIX, com o pipocar de movimentos ocultistas, espíritas, teosofistas etc., a Franco-Maçonaria foi invadida por crendices, rituais mágicos, doutrinas espúrias e todo tipo de exotismo pseudo-espiritual.

Ao cenário judaizante já instalado, se unem os magos ao estilo de Henry Olcott e seus teosofistas que, para piorar a situação já caótica, resolvem "doutrinar" a Franco-Maçonaria com as doutrinas de H.P.Blavatsky, A. Besant., Leadbeater etc. Obviamente que junto dessa mistura, se agregam pensamentos confusos, doutrinas políticas modernas e alternativas, o que dificultou, e muito, o trabalho de pesquisadores sérios. 

Baseados no que viam, ou seja, uma instituição recheada de pessoas 'místicas' e 'liberais', muitos pensadores condenaram a Franco-Maçonaria como uma instituição revolucionária e com fins imorais.

No final do século XIX, alguns movimentos políticos de natureza secreta ou semi-secreta, instrumentalizaram a Franco-Maçonaria para seus próprios objetivos.

Valendo-se da reserva, do sigilo das lojas e do alto número de pessoas influentes que as frequentavam, esses movimentos injetaram suas idéias e lançaram seus tentáculos para dentro da Franco-Maçonaria, confundindo-se com ela mesma. Daí a extrema reserva com que alguns escritores tradicionais e monarquistas tratam a Franco-Maçonaria, por confundirem-na com seus parasitas...

Dessa forma, a Franco-Maçonaria sofreu um desvio revolucionário que a desfigurou em muito e, tal desvio, ainda é muito pouco notado pelos seus membros. 

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